E ainda: negros têm dificuldade maior de conseguir trabalho e, quando empregados, ocupam os piores postos e têm maior dificuldade de ascender profissionalmente
Melhores condições no mercado de trabalho, obtidas no período recente, não foram suficientes para reduzir o abismo de renda entre negros e não negros no Brasil. É o que revela boletim divulgado nesta semana pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), do IBGE, referentes ao 2º trimestre de 2024.
Apesar representarem a maioria da população brasileira (55%) e dos trabalhadores ocupados (55%), além de terem remuneração média 40% inferior ao rendimento dos não negros, quando empregados, negros e negras ocupam os piores postos e têm dificuldades maiores de ascenderem profissionalmente.
Ainda que tenham ensino superior, a população negra ganha 32% menos que os demais trabalhadores com o mesmo nível de ensino. E, ao longo de todo de toda a vida laboral, entre os 18 e 65 anos, recebem R$ 899 mil menos que os não negros – entre os formados, o valor chega a R$ 1,1 milhão. Só em 2024, se os trabalhadores negros tivessem os mesmos salários e as mesmas taxas de desemprego dos trabalhadores brancos, teriam ganhado R$ 103 bilhões.
As mulheres negras são as mais prejudicadas neste cenário: no 2º trimestre de 2024, o rendimento médio delas no país era de R$ 2.392, valor 40% inferior ao dos demais trabalhadores (R$ 4.008).
“A Essa distorção, que coloca a mulher e o homem negro em condições desiguais no mundo de trabalho, é um sintoma de que ainda não superamos os efeitos da escravidão”, avalia o secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Almir Aguiar. “Como o boletim do Dieese destaca, o mercado de trabalho talvez seja um dos meios onde a discriminação racial e a desigualdade sejam mais evidentes”, completa.
Principais desafios
O boletim do Dieese observa que os desafios da população negra começam na inserção ao mercado de trabalho. No 2º trimestre deste ano, quase metade dos ocupados negros estava na informalidade: 46% das mulheres e 45% dos homens. No mesmo período, entre os não negros a taxa de informalidade era 34%.
Em todas as 10 ocupações com os maiores rendimentos, na fase analisada, a população negra era minoria, representando somente 27% dos profissionais. Ao mesmo tempo, nas 10 ocupações com os piores rendimentos, a realidade é inversa, com negros representando 70% dos profissionais.
“Esses números não são coincidência. A presença dos negros é maior em ocupações de menor prestígio e que geram menores rendimentos”, destaca a equipe do Dieese no trabalho, acrescentando em seguida que uma a cada seis mulheres negras ocupadas (15,5%) trabalha como doméstica, com remuneração inferior abaixo da média e, ainda, que as empregadas domésticas negras, sem carteira, recebiam em média R$ 950 por mês, valor R$ 461 abaixo do salário-mínimo de hoje.
Avanço depende de políticas públicas direcionadas
O Dieese conclui que, apesar de a Lei de Contas, sancionada em 2012, ter contribuído para o aumento da escolaridade entre negros e negras, a diferença de rendimentos entre essa população e a população de não negros permanece a mesma de 12 anos atrás.
Entre o 2º trimestre de 2012, período exatamente anterior à Lei de Cotas, e o 2º trimestre de 2024 mais que dobrou (de 3,9% para 9,2%) a proporção de negros e negras com ensino superior completo. Porém, durante todo o período, a desigualdade racial de rendimentos se manteve igual, com a população negra ganhando entre 68% e 70% do rendimento médio dos não negros.
O quadro reforça a importância de políticas públicas direcionadas e permanentes para reduzir essa disparidade, avalia Almir Aguiar. “Falamos de políticas públicas voltadas ao combate da redução de renda com foco na população negra. Um exemplo muito positivo é a lei de igualdade salarial entre gêneros (n° 14.611), sancionada no ano passado, e que contém metas para reduzir a desigualdade salarial entre a população em geral e as mulheres negras”, ressalta o secretário de combate ao Racismo da Contraf-CUT.
A presidenta da Contraf-CUT e vice-presidenta da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Juvandia Moreira, completa, também com base em dados do Dieese, que, em 2024, 86% das negociações coletivas resultaram em reajustes acima da inflação, com ganho médio de 1,49% nos salários.
“Os reajustes, frutos de negociações coletivas, trazem um ganho adicional médio de R$ 250 bilhões por ano para o bolso dos trabalhadores, portanto para a economia, o que significa que as negociações coletivas trazem crescimento para todo o país, porque colocam dinheiro no bolso do trabalhador, que faz a economia crescer, gerar emprego e aumenta a arrecadação. Além disso, cada 1% de ganho real que os sindicatos negociam, significa a geração de 200 mil empregos e 0,15% de crescimento no PIB, por ano”, observa a dirigente.
Em relação aos negros e negras no sistema financeiro, Juvandia destaca que a categoria bancária conquistou na Campanha Salarial deste ano avanços sociais fundamentais, com destaque para o comprometimento, por parte dos bancos, de bolsas de estudos para que mulheres negras se profissionalizem em tecnologia da informação (TI), a área que mais cresce no sistema bancário.
“Reconhecemos que ainda existe muito o que fazer para a categoria. Levantamentos nossos apontam que as mulheres bancárias recebem cerca de 22% menos que os homens bancários. E, se a mulher for negra, estamos falando de uma remuneração média 78,9% menor do que os colegas brancos do sexo masculino no setor. Por causa desse cenário é que o direito a igualdade de oportunidade, seja entre gêneros ou entre raça, é uma das nossas principais bandeiras permanentes”, conclui.
Clique aqui e acesso o boletim especial do Dieese “Dia da Consciência Negra” na íntegra.
Fonte: Contraf-CUT
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